segunda-feira, 12 de maio de 2008

Calvário IV


Terminado o tempo de repouso em casa, regressava ao IPO para um novo internamento, para mais uma dose daquele líquido avermelhado. Cheguei bem cedo, mas logo que lá entrei já sentia enjoos, mesmo sem sentir o cheiro da comida. Constatei que tinha adquirido um trauma psicológico como reacção ao que tinha passado no primeiro tratamento.
Tinha uma pequena cirurgia marcada para essa manhã. Ia ser colocado no meu peito um êmbolo para fazer a infusão da quimioterapia através de uma veia mais forte, visto que as veias das mãos não aguentam a agressão provocada. Fui conduzido ao bloco operatório, onde me atordoaram com a anestesia e realizaram a cirurgia. Quando acordei estava na sala de recobro, sentia uma sensação muita estranha, um entorpecimento total do corpo, provocado pelo efeito anestésico. Após o tempo de recuperação naquela sala, regressei ao piso 3 para recomeçar a quimioterapia.
Esta nova semana de tratamento foi uma batalha bastante árdua, em que a fraqueza e o desânimo se apoderaram do meu ser. Estava mais isolado, pois a enfermaria era apenas de dois pacientes. Ao meu lado estava um senhor com um tumor nos intestinos. Viria a ter conhecimento do seu falecimento uns dias mais tarde.
Os dias passavam muito lentamente, os efeitos da quimioterapia estavam cada vez mais visíveis em todo o meu ser. Os enjoos continuavam com bastante frequência, fazia febre, sentia calafrios por todo o meu corpo. Era tratado com muita atenção e carinho, mas era apenas uma gota num profundo oceano de sofrimento.
Chegara ao fim a segunda fase de quimioterapia, voltava a casa demasiado frágil para conseguir reunir forças suficientes para um novo tratamento. Tinha a noção que precisava de me alimentar, que era necessário arranjar forças para enfrentar as próximas etapas, mas como o iria conseguir era uma pergunta para a qual não possuía alguma resposta.
Poucos dias consegui resistir em casa, pois a seguir à Páscoa, aconteceu o que seria mais previsível. Cheguei ao limite das minhas capacidades, bati no fundo. Num dia, comecei a sangrar pelo nariz o que acontecia com relativa frequência, mas desta vez não estava a conseguir estancar o escorrimento nasal. Desloquei-me ao Centro de Saúde, onde, talvez devido ao meu estado de saúde, me senti mal atendido pela enfermeira e pela médica de serviço. Saí porta fora sem discutir e dirigi-me a uma clínica de uma enfermeira conhecida, onde fui recebido com carinho e tratado com dignidade. A enfermeira conseguiu fazer parar o escorrimento do sangue e regressei a casa sentindo-me ainda mais fraco. O cansaço era tanto que perdia a visão quando me confrontava directamente com o sol.
Nesse mesmo dia à noite, quando estava deitado para dormir, sentia o meu corpo demasiado quente. Através da medição do termómetro, constatei que estava com febre bastante alta.
Liguei para o IPO a comunicar a minha situação e disseram-me que o melhor seria dirigir-me imediatamente para lá. Vesti-me e fui de emergência para o Porto. Cada minuto perdido poderia significar um agravamento maior do meu estado de saúde.
O meu corpo não aguentou face ao tratamento da quimioterapia. Precisava de saber qual a gravidade do meu estado actual e quais seriam as próximas etapas a que teria de me submeter…

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